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Artigo do Dr. Daniel Curty: A INSEGURANÇA JURÍDICA TRAZIDA PELA "REFORMA TRABALHISTA".

A INSEGURANÇA JURÍDICA TRAZIDA PELA "REFORMA TRABALHISTA".

 

A Lei nº. 13.467/2017 em vigência desde 11/11/2017, intitulada como "Reforma Trabalhista", tinha como fundamento basilar conceder maior segurança jurídica às relações de trabalho. Contudo, elaborada de forma açodada, sem apoio jurídico-científico e trazendo normas manifestamente contrárias ao texto constitucional, acabou produzindo efeito reverso, criando maior insegurança jurídica à população. E tal insegurança foi imediatamente acusada pelo próprio Governo Federal que, três dias após a sua entrada em vigor, editou a Medida Provisória nº. 808, de 14/11/2018, já reformando a Lei nº. 13.467/2017. Pior, na incerteza de ser, ou não, convertida em lei diante do caótico cenário político nacional, as alterações introduzidas na "Reforma Trabalhista" podem ser apenas temporárias.

Se a forma da sua edição, por si só, já cria um cenário de insegurança jurídica, o texto da Lei nº. 13.467/2017 somente o reforça. Tanto os trabalhadores quanto os empregadores vivenciam momento de total obscuridade e incerteza, sem segurança para a prática de atos de implantação das novas regras ou para o exercício dos direitos nelas previstos.

Vamos além, tudo sem o respaldo do Poder Judiciário, em especial do órgão de cúpula trabalhista, o Tribunal Superior do Trabalho, que até o momento não se pronunciou sobre a aplicação da Lei e nem mesmo reviu suas súmulas, deixando sem norte os trabalhadores, os empregadores, os advogados e até mesmo os magistrados. Embora, em geral, não vinculantes, as súmulas representam a uniformização da jurisprudência e servem como parâmetro regulatório das relações jurídicas, eis que representam a possível solução de um eventual litígio. Mas as súmulas do Tribunal Superior do Trabalho prejudicadas pelo texto da Lei nº. 13.467/2017 sequer foram revisadas ou canceladas.

Relembremos que, quando da entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil, ocorrida em 18/03/2016, o Tribunal Superior do Trabalho já havia editado, no dia 15/03/2016, a Instrução Normativa nº. 39/2016 para nortear as partes, advogados e juízes quanto às normas que seriam compatíveis com o Processo do Trabalho, concedendo segurança quanto à aplicação da novel legislação na Justiça do Trabalho. Mas, com relação a "Reforma Trabalhista", nenhum ato prévio.

Não obstante, há luz no fim do túnel, pois está prevista para 06/02/2018 sessão do Tribunal Pleno para análise de 35 propostas de alterações das Súmulas e Orientações Jurisprudenciais, a qual contará com a participação de representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Decerto, o resultado concederá maior tranquilidade e segurança a todos na aplicação da lei.

E, enquanto o Poder Judiciário não se posiciona de forma concreta, os efeitos prejudiciais da insegurança jurídica são enormes.

Por um lado, os trabalhadores receosos do ajuizamento de demandas trabalhistas e de sofrerem com as despesas processuais e honorários advocatícios sucumbenciais por não conseguirem provar os fatos constitutivos do direito alegado. Não que não devam pagar. O problema reside na forma prevista no novel texto legal e como está sendo tresloucadamente aplicado por alguns magistrados. Não podemos esquecer que os trabalhadores estão submetidos a uma condição de extrema sujeição ao empregador, em condição de vulnerabilidade e hipossuficiência jurídica. A prova para o empregado é extremamente difícil de ser produzida, pois normalmente não tem acesso prévio aos documentos e enfrenta grandes obstáculos para produzir a prova testemunhal, tais como: o  distanciamento após o rompimento da relação de trabalho; o temor dos colegas em prestarem depoimentos compromissados perante autoridade judiciária; ou o receio, dos que ainda trabalham no empregador, em perder o emprego se retratarem a verdade dos fatos.

Tal condição de vulnerabilidade jurídica foi ignorada na elaboração da lei e acaba criando um efeito nefasto à postulação de direitos. Mesmo sabendo que determinada verba ou obrigação foi inadimplida, deixa-se de reclamar judicialmente pelo receio de não conseguir comprovar o fato constitutivo do direito alegado e, ao final, suportar os ônus sucumbenciais.

Embora a regra evite as lides temerárias, o meio para coibir tal prática não deve ser punir o reclamante, até mesmo aquele sem condições financeiras de suportá-la, com a condenação desmedida aos ônus sucumbenciais, mas sim identificar a conduta abusiva e efetivamente aplicar as sanções processuais e, também, disciplinares. E a parte também não pode se sentir coagida pela nova norma e deixar de postular o seu direito, que é irrevogável, mas sim exercê-lo, debatendo a sua inconstitucionalidade caso venha a ser sucumbente e a sofrer a condenação.

Felizmente, a Procuradoria Geral da República imediatamente ingressou com a ADI 5766 junto ao Supremo Tribunal Federal questionando a inconstitucionalidade dos artigos 790-B e 791-A da CLT, a qual, se reconhecida, trará maior segurança aos trabalhadores. Igualmente, várias outras ADI's já foram ajuizadas contestando a constitucionalidade de diversos outros dispositivos. Entrementes, enquanto não julgadas, resta a insegurança jurídica.

Por outro lado, empregadores satisfeitos com a desregulamentação das relações trabalhistas, estão aplicando-a de imediato para desonerar a folha de pagamento e auferir maiores lucros, sem realizar adequado juízo de risco. Baseiam-se em favorecimento ilusório, pois fundados em normas flagrantemente inconstitucionais e que assim possivelmente serão declaradas. Sujeitam-se a criar um passivo trabalhista expressivo pela possibilidade do julgador declarar incidentalmente a inconstitucionalidade do texto legal, para assegurar ao trabalhador o direito retirado ou reduzido, ou ainda do Supremo Tribunal Federal reconhecer a sua inconstitucionalidade no controle concentrado, com efeito retroativo (que é a regra), obrigando os empregadores a reporem os respectivos valores ante a sua natureza alimentar e o seu caráter irrevogável.

E se percebe que os empregadores mais atentos e cuidadosos, mesmo favorecidos pela "Reforma Trabalhista", estão com receio de aplicá-la imediatamente, exatamente pela possibilidade de criar um expressivo passivo trabalhista, tamanha inconstitucionalidade de determinados dispositivos.

Neste cenário de manifesta insegurança jurídica e de julgados conflitantes, ganha relevância a figura do advogado, a quem compete executar o primeiro juízo de viabilidade do pedido diante dos elementos probatórios que lhe são apresentados, reduzir os riscos da sucumbência com a sua retórica, defendendo suas teses, e orientar seus clientes das alterações e do melhor caminho a seguir.

A "Reforma Trabalhista" de fato foi ruim para trabalhador, e talvez até mesmo para o empregador pela imprevisibilidade quanto a sua validade. Mas não o foi para o advogado, que terá seu labor aumentado com consultas, pareceres, orientações e demandas judiciais. O advogado se sobressai em meio às crises, criando soluções aos litígios e reduzindo as inseguranças sociais com elaboração de suas teses jurídicas, as quais, quando acolhidas, servem de base para a criação da jurisprudência e até mesmo para novas legislações. Não menos a Constituição da República, em seu artigo 133, prevê que "O advogado é indispensável à administração da justiça [...]".

Compete a nós, advogados, por intermédio do nosso ofício, suplantar a desídia dos Poderes ao elaborar o texto legal e a omissão em nortear a sua aplicação. Compete a nós, advogados, atacar o retrocesso legislativo, buscando a efetividade dos direitos vilipendiados em ofensa ao texto constitucional. Compete a nós, advogados, traçar e arguir as teses jurídicas que sustentarão a uniformização da jurisprudência. Enfim, compete a nós, advogados, em meio ao caos legislativo e jurisdicional, fazer renascer a segurança jurídica necessária à paz social.

 

DANIEL NEVES CURTY

Advogado - OAB/RJ 143.392

Pós-graduado em Direito Privado pela UVA 

Pós-graduando em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pela UNISAL

 

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